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Desafio de Escrita

Tema 2 - Charneca em Flor

27
Mai21

A chave rodou na fechadura com alguma dificuldade o que não me surpreendeu. Afinal, aquela
porta já não devia ser aberta há anos.
Durante muito tempo não fui capaz de entrar na casa da minha avó onde passei os momentos
mais felizes da minha infância. Mas desde dia negro da “zanga", nunca mais vi a minha avó. Os
meus pais levaram-me para longe, cresci e fui-me esquecendo desta pessoa que tanto me
amou. Só que ela nunca se esqueceu de mim deixando a sua casa como herança. O meu
coração foi invadido pela culpa por ter deixado que a minha avó partisse sem sentir,
novamente, o meu abraço e levei anos a decidir voltar aqui.
Depois de algum esforço , lá abri a porta para poder entrar. Logo ali, na entrada, fiquei
envolvida, dos pés à cabeça, em teias de aranha. Encontrei uma janela que estava tão perra
como a porta. Abri-a permitindo que a claridade do dia iluminasse aquele cenário desolador.
Os móveis estavam protegidos com lençóis velhos e plásticos mas, em cima deles, repousava
uma espessa camada de pó.
Continuei a explorar a casa da qual me recordava vagamente. Quando encontrei a cozinha,
lembrei das muitas horas que passava com a minha avó a cozinhar. Só que aquela cozinha é-
me estranha. Não reconheci aquele fogão ou aquela bancada por mais que rebuscasse na
minha memória. Não consegui visualizar a minha avó naquele espaço. Talvez a cozinha tivesse
sido remodelada.
Olhei através do vidro baço da janela e reparei numa outra construção diante da cozinha. Por
coincidência, ou talvez não, ao lado da porta estava uma chave identificada com “cozinha do
quintal”. Será…
Meia dúzia de passos separavam a casa principal daquele anexo. Assim que me aproximei,
senti-me invadida por uma sensação de conforto. Estranhamente entrei, com relativa
facilidade, e comigo entraram também os raios de sol que fizeram brilhar algo que se
encontrava em frente da porta. Foi então que o vi, tão reluzente como se fosse novo, o fogão a
lenha da minha avó. Só nesse instante é que as recordações regressaram em catadupa. Senti a
presença da minha avó visualizando-a enquanto mexia os tachos confeccionando comida
reconfortante que me enchia o estômago e a alma. Caí de joelhos diante do fogão a lenha da
minha avó e chorei pelo tempo irrecuperável que passei longe dela. Pela porta entrou uma
brisa que me abraçou e enxugou as lágrimas. Só podia ser a minha avó. Finalmente reconciliei-
me com o passado e resolvi começar a limpeza pela maravilhoso fogão da minha avó. Só
faltava aprender a cozinhar ali e assim honrar-lhe a memória, entre tachos e tachinhos.

Charneca em Flor escreve aqui. 

 

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