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Desafio de Escrita

Tema 2 - Caracol

31
Mai21

Ninguém sabe quando chega o fim. Quando o apito do monitor se torna num zumbido constante, numa linha infinita acusando o eco vazio de um coração parado.

Amadeu tinha a certeza que o seu fim estava próximo, quando a inconsciência lhe foi imposta.

Preso a uma máquina que lhe ditava o ritmo e intensidade da respiração, inconsciente da sua fragilidade e de como o corpo se agarrava a cada fio de vida, Amadeu sonhava.  

Na verdade, não sabia se sonhava ou se apenas divagava, entre memórias perdidas do acervo de alguém que já viveu mais do que a estatística diz ser a média comum. 

- Não precisamos de outro fogão, Irene! 

- Amadeu, este fogão nem sequer é um fogão! É um bico de gáz, homem! É claro que precisamos de um fogão. É preciso fazer a sopa para o menino, coitadinho... só com um bico não consigo dar vazão a tudo, 'Madeu!

Suspirou, como quem assume a derrota. Estavam ambos a fazer um esforço árduo para construir a casa. Não era um palácio, nem sequer uma mansão, só pretendiam um abrigo modesto a que pudessem chamar lar durante o resto da vida. Havia já paredes ao alto e placas de chão assentes, mas faltava ainda um bom tecto e um telhado eficiente. Para o fogão, ou para o outro fogão, seriam precisos três contos e quinhentos. Dois meses do seu salário, um mês a jantar água de arroz e mais meio ano a adiar um telhado eficiente. Para já, o tecto de cimento ia aguentando a chuva e entretanto chegaria a primavera com o tempo mais ameno e seco. Sim, podia adiar o telhado mais um pouco. Não mais que as duas estações que faltavam, mas o patrão também lhe prometera um aumento da jorna, talvez até conseguisse o telhado antes, se o aumento se verificasse. Olhou para a mulher embalando o pequeno António, cantarolando-lhe baixinho e percebeu que mais um mês a água de arroz pouca diferença lhe faria. O fogão iria facilitar a vida da mulher e talvez até Irene conseguisse mais alguns arranjos de costura para ajudar à despesa. 

- Amanhã vamos à loja do s'Alfredo e lá vemos se se arranja outro fogão.

O corpo adormecido manteve-se imóvel ao rever aquele dia, mas dentro dele, um Amadeu soluçava silenciosa e copiosamente, questionando se algum dia voltaria a ver Irene e o fogão, já velho e ferrugento nas bordas, mas onde ainda fervia o leite, todas as manhãs.  

 

A Caracol escreve aqui. 

 

Tema 2 - Carla

31
Mai21
Estava no festival sudoeste, numa fase boa da noite. Foi numa edição antiga do Festival, daquelas onde ainda não existia publicidade e brindes a cada esquina. O clima estava perfeito, a noite limpa e a mente exatamente como se quer num festival de música de verão. Era bom.

O fogão a gás tinha avariado, estava partido… não funcionava, ou lá o que era. Não me interessava muito... Naquela altura não me interessava muito comer.

Estávamos com alguns amigos dele a ver o concerto de Franz Ferdinand. De repente, ele desapareceu. “Foi buscar o outro fogão.”, disse o Zé.
 
O fogão? Qual fogão?

Na minha mente, provavelmente já pouco sóbria, passaram todo o tipo de filmes. Estava a vê-lo ali, um pouco mais atrás, um pouco mais à frente, com uma rapariga qualquer. Olhei para um lado, para o outro, e a minha mente mandou-me parar. Pensei durante 3 segundos e saí dali.

Estava furiosa. Furiosa. A minha mente parecia delirar febrilmente com os dramas que concebia, alimentados a ciúmes doentios.

Vestida com uma saia preta fluida, um top finíssimo e com uns sapatos pretos de salto alto, percorri, sem destino, o solo de terra seca e poeirenta. A determinada, um grupo de rapazes meteu-se comigo, com decência e cuidado. Não posso jurar, mas pareceram genuinamente curiosos com a minha indumentária pouco adequada a um festival de música. Despachei-os rapidamente com alguma rispidez. Estava mesmo muito mal-humorada.

Até que ouvi a música.

Sentei-me num monte de terra, com o palco à minha frente. E ouvi, pela primeira vez, Life on Mars, pelos Divine Comedy, na versão de Yann Tiersen.
Tudo o que existia à minha volta, desapareceu. Esfumaram-se as pessoas, as barracas, os cheiros, as vozes e os quilos de terra em forma de pó.  

A tela da minha realidade encheu-me de uma cor cintilante e dourada sobre o fundo de uma noite de verão perfeita. Era só eu e aquela música.
E ter ido ali, mesmo de saltos altos e roupa estranha, fez todo o sentido. Estava tudo exatamente como devia estar.

Quando voltei para junto das outras pessoa e vi o meu namorado outra vez, nem me lembrava do que me tinha feito sair, furiosa, do concerto de Franz Ferdinand.

“Eu? Não te vi e fui dar uma volta e ver os outros concertos.”, disse eu, sorridente e bem-disposta.

Mais tarde, num canto da tenda, estava o outro fogão.
 
Carla escreve aqui. 
 

Tema 2 - Marta

30
Mai21

"Certo dia, conversava um casal de namorados...

 

Ele: Tens mesmo que ir?

Ela: Sabes que sim.

Ele: Porque não ficas aqui comigo?

Ela: Porque tenho que ir trabalhar.

Ele: Estou farto de ter que te partilhar com ele. Queria-te só para mim.

Ela: Pois, mas é ele que me garante o dinheiro ao fim do mês.

Ele: Eu também te podia pagar. E não tinhas que o ver mais.

Ela: Já te disse várias vezes que não quero misturar as águas. Uma coisa é a minha relação. Outra, é o trabalho. Além disso, eu gosto do que faço.

Ele: Mas depois, sempre que estou contigo, sinto o cheiro dele. Daquilo que fazes com ele. E fico cheio de inveja, e ciúmes, por não ser eu. 

Ela: Amor, sabes que eu gosto muito de ti, mas nunca na vida poderias ser ele. Nem eu ia querer isso. Prefiro que sejas quem és. Além disso, sabes que partilho sempre contigo aquilo que fizemos juntos.

Ele: Mas não é suficiente. Precisamos de mais tempo para nós. E ele está constantemente a roubar-te de mim.

Ela: E tu estás a querer roubar-me a ele! Não sejas imaturo.

Ele: Não sou imaturo. Sou realista.

Ela: Bem, podes sempre vir comigo e divertimo-nos os três!

Ele: Alguma vez? Não fui feito para isso. Não tenho esse teu dom para aguentar gestos repetitivos, fazer o mesmo uma vez e outra, sem querer fugir.

Ela: Então, não te queixes. 

Ele: E se eu te pedisse para escolher entre eu e ele? Eras capaz de me deixar?

Ela: Tens dúvidas?! Isso seria demasiado infantil da tua parte, até porque também acabas por usufruir daquilo que faço. Mas não me ponhas à prova, porque ficas a perder.

Ele: Traidora! 

Ela: Exagerado! E, por falar nisso, estou atrasada. Tenho mesmo que ir cometer umas infidelidades!

 

E nisto, ela levanta-se, veste-se, e dirige-se ao seu posto de trabalho, na cozinha, onde o fogão a espera, para mais uma maratona de iguarias que ela terá que cozinhar, para satisfazer as encomendas do dia!

 

Marta escreve aqui. 

Tema 2 - Gaivota Azul

30
Mai21

Aromas de ervas mil enchem o ar.

Faz tempo que não cozinho. Sempre ajudou a clarear ideias.

Instintivamente reúno os ingredientes que irei necessitar.

Não preciso medir ou pesar, a mão não me falha.

Anos a fio em torno do fogão fizeram de nós cúmplices.

Lamurias, lamentos, dúvidas, esperanças e lembranças, tudo partilhámos.

 

Hoje olhei a imagem refletida no espelho e não me reconheci.

Acenei-lhe e ela sorriu-me de volta.

Vislumbres de uma vida preenchida, de uma vida feliz!

Imagens tão nítidas que negaria terem-se passado sessenta anos.

Abracei-me. Ainda vivo em mim! 

 

Ocasionalmente passeio-me pelo passado.

Ultimamente agarro-me ao Aqui e Agora.

Tudo é efémero! A começar por mim.

Recuso-me a aceitar a noite eterna.

Obstinada, regresso ao comando daquele que sempre me pertenceu.

 

Frequentemente dou por mim a divagar. Resisto.

Organizo mentalmente os próximos passos.

Gestos rotineiros ensaiados e repetidos até à perfeição (ou exaustão)

Alguém bate à porta. É novamente a Saudade a chegar.

Oiço o que tem para contar. Algo me diz que desta vez veio para ficar.

 

Gaivota Azul escreve aqui.

Tema 2 - Drama Queen

29
Mai21
 

Em tempos longínquos onde havia liberdade de conviver...Entram na sala onde havia muita comida.

- Ai filha, que festa tão bonita...

- Ainda bem que gosta também não é todos os dias que se faz 100 anos!

- Ó filha como é que conseguiram fazer esta comida toda...

- Comprei um Robot de Cozinha ajuda fazer a comid...

- Á filha então a comida não presta feita nessas coisas, faz muito rápido....

- Afinal, havia outro fogão. Mais duas senhoras ajudar a fazer isto tudo.

Também existia pequenas mentiras para poder sermos felizes com as nossas pequenas verdades.

 

A DramaQueen escreve aqui.

Tema 2 - Lara Almeida

29
Mai21

Uma separação nunca é fácil. Não é uma decisão tomada de ânimo leve. É sempre, no mínimo, um falhanço pessoal.

Uma separação sem consenso é ainda pior.... Onde não há espaço para se ser civilizado, onde não há respeito pelos anos e bons momentos que passaram juntos.

Hoje, após a assinatura do divórcio, tinham seguido para casa para dividirem finalmente todos os bens materiais. Viviam numa casa alugada e tinham de a entregar o quanto antes... Mas, até na divisão, não havia cordialidade, não conseguiam ter consenso... Pareciam dois desconhecidos a lutar. Tudo era motivo de discussão.

Discutiam por tudo. Pelos tapetes, pela mobília de quarto, até pela sapateira. Mas quando chegaram às coisas de cozinha é que foram elas...ela dizia querer os eletrodomésticos, ele também. Até iam começar a discutir pelo fogão, mas afinal havia outro na garagem muito parecido que lhes tinha sido oferecido e nunca usaram... 

Perfeitos desconhecidos a lutar por um fogão. Era tão surreal que parecia um texto inventado!....

Lara Almeida escreve aqui.

Tema 2 - Maria

28
Mai21

A viagem tinha sido longa e com tantas paragens para fotografar e conhecer cada cantinho, acabamos por chegar já bem tarde ao lugar onde íamos passar o fim-de-semana.

Tínhamos acabado de acordar naquela natureza tão boa mas o tempo não estava o mesmo que no dia anterior. De todo. Estava meio farrusco e decidimos que íamos fazer um bolo. Bolo de chocolate - digo eu - para ser um bom pequeno-almoço, sem horários a cumprir e sem regras, excepto ser feliz.

Perdidos enquanto seguíamos a receita do bolo de chocolate, farinha para aqui e para acolá, açúcar na ponta do nariz - aqueles beijos que ainda se tornaram mais doces - digo eu - olha esquecemos de pré-aquecer o forno...

Vamos a ligar e nada. Nem sim nem sopas, o forno tinha morrido, nada de sinal dele. Nem o fogão estava a funcionar. O micro-ondas dava sinal, mas de resto mais nada.

Fazemos um bolo de caneca no micro-ondas? Atirou ele enquanto ria da minha cara.

- Olha agora com a receita pronta não dá!

E entre gargalhadas, acabamos  por comer a massa do bolo que estava uma delícia. Quem não gosta de raspar uma massa de bolo? - pergunto eu enquanto ele me olhava com aquele olhar fofo, sentados no sofá em frente à varanda de vidro que nos deslumbrava com a vista desafogada tão verde e apaixonante na montanha. Estávamos ali a apreciar só o momento. Aquele silêncio como se nos tivéssemos perdido algures onde o gps não chega, mas com todas as certezas de que aquele era o lugar certo para estar.

Antes mesmo de as dores de barriga não serem só de tanto rir ele reparou: Temos ali um bilhete em cima da mesa, já viste?

Pegamos no bilhete e era da Joana, a nossa amiga e dona da casa da montanha, um bilhete de boas vindas, mas como chegamos bem tarde nem tínhamos reparado e em que dizia:

"Amigos, aproveitem a estadia e desculpem qualquer coisa que não esteja do vosso jeito. PS.: A cozinha ainda foi mudada à pouco e tive problemas com a placa e o forno. Caso  precisem na dispensa têm outro fogão... a gás.  Sejam felizes!"

Não acredito... um fogão a gás e que dá para usar a fornalha!! Cadê a massa do bolo?

 

Maria escreve aqui. 

Tema 2 - Cátia Madeira

28
Mai21
A reunião PEE ia ser na casa da Branca de Neve. Ariel foi a primeira a chegar, situação que desagradou a anfitriã, já que a princesa dos mares fazia corta mato pelo Tejo e chegava à Moita encharcada. Os cabelos ainda pingavam bastante e deixavam poças de água por onde passava, coisa que ensandecia a dona da casa, que ainda estava a pagar o empréstimo para obras que usou para comprar aquele chão flutuante de qualidade mediana.

- Ariel, põe-te na alheta para o quintal, serve-te de um conhaque e mete a mona ao sol. A ver se secas essa trunfa farta que até me mete nojo! – Branca de Neve não sabia o que a arreliava mais, se o facto de aquela cabra aquática ter uma vida aparentemente livre de stress e por isso não apresentar qualquer queda de cabelo, se a inocência em vinha de alhos de burrice, que acalentava aquela falta de noção absoluta. Enquanto as outras princesas apareciam com os filhos agarrados as saias, Ariel tinha as irmãs que lhes ficavam com os miúdos. Parou a olhar para Ariel, que estava que cheirava as buganvílias e imaginou-se a acender o carvão e a grelhar-lhe a cauda.

O toque da campainha arrancou-a desse quase sonho. Chegavam Pocahontas e Cinderela, ambas com as crianças agarradas às pernas.

- Meninos, a tia Branca preparou guloseimas e colocou tudo numa mesa no quintal. – a criançada ficou histérica saiu a correr, quais animais selvagens.

- Mãezinhas, conhaque ou Whiskey? – perguntou Branca erguendo as duas garrafas.

- Um de cada. – respondeu Cinderela, sendo que Pocahontas acenou em confirmação de que o seu pedido era igual.

O grupo PEE representava as “Princesas em Estrume”. Mulheres que um dia haviam feito parte do imaginário encantado de muitas gerações e que hoje, depois do pífio “felizes para sempre” viviam enredadas na vida desgastante e comezinha de sempre.

Os príncipes, depois do beijo do verdadeiro amor, queriam ver a bola, evitavam trocar fraldas e achavam que as fases das mulheres duravam muito tempo.

Criaram o grupo depois do divórcio da Bela com o Monstro. Coisa que rolou água já que nas partilhas o tipo não queria rachar 50/50 os bens adquiridos depois do matrimónio.

Ouviu-se algo a apitar.

- Merda, são as bolachas que tenho no forno. Fiz normais para os miúdos e para nós com ervas aromáticas. – piscou o olho. Todas sabiam o que eram aquelas ervas.

Ariel estava a entrar na sala quando sentiu o cheiro e viu Branca passar com uma bandeja de bolachas.

- Meninos, bolachinhas acabadas de fazer.

Ariel esbugalhou olhos.

- Branca, chamon para as crianças!?

Branca nem se deu ao trabalho de responder. Não lhe faltava vontade de os sossegar, mas não era choné para isso. Até porque se um dos miúdos respondesse mal à aromatização, depois como é que se explicava aquilo em contexto judicial?

Foi quando Ariel a viu abrir uma segunda porta de forno que se apercebeu. Muito se cozinhava naquela casa para haver eletrodomésticos em duplicado.

A Cátia escreve aqui.

Tema 2 - Charneca em Flor

27
Mai21

A chave rodou na fechadura com alguma dificuldade o que não me surpreendeu. Afinal, aquela
porta já não devia ser aberta há anos.
Durante muito tempo não fui capaz de entrar na casa da minha avó onde passei os momentos
mais felizes da minha infância. Mas desde dia negro da “zanga", nunca mais vi a minha avó. Os
meus pais levaram-me para longe, cresci e fui-me esquecendo desta pessoa que tanto me
amou. Só que ela nunca se esqueceu de mim deixando a sua casa como herança. O meu
coração foi invadido pela culpa por ter deixado que a minha avó partisse sem sentir,
novamente, o meu abraço e levei anos a decidir voltar aqui.
Depois de algum esforço , lá abri a porta para poder entrar. Logo ali, na entrada, fiquei
envolvida, dos pés à cabeça, em teias de aranha. Encontrei uma janela que estava tão perra
como a porta. Abri-a permitindo que a claridade do dia iluminasse aquele cenário desolador.
Os móveis estavam protegidos com lençóis velhos e plásticos mas, em cima deles, repousava
uma espessa camada de pó.
Continuei a explorar a casa da qual me recordava vagamente. Quando encontrei a cozinha,
lembrei das muitas horas que passava com a minha avó a cozinhar. Só que aquela cozinha é-
me estranha. Não reconheci aquele fogão ou aquela bancada por mais que rebuscasse na
minha memória. Não consegui visualizar a minha avó naquele espaço. Talvez a cozinha tivesse
sido remodelada.
Olhei através do vidro baço da janela e reparei numa outra construção diante da cozinha. Por
coincidência, ou talvez não, ao lado da porta estava uma chave identificada com “cozinha do
quintal”. Será…
Meia dúzia de passos separavam a casa principal daquele anexo. Assim que me aproximei,
senti-me invadida por uma sensação de conforto. Estranhamente entrei, com relativa
facilidade, e comigo entraram também os raios de sol que fizeram brilhar algo que se
encontrava em frente da porta. Foi então que o vi, tão reluzente como se fosse novo, o fogão a
lenha da minha avó. Só nesse instante é que as recordações regressaram em catadupa. Senti a
presença da minha avó visualizando-a enquanto mexia os tachos confeccionando comida
reconfortante que me enchia o estômago e a alma. Caí de joelhos diante do fogão a lenha da
minha avó e chorei pelo tempo irrecuperável que passei longe dela. Pela porta entrou uma
brisa que me abraçou e enxugou as lágrimas. Só podia ser a minha avó. Finalmente reconciliei-
me com o passado e resolvi começar a limpeza pela maravilhoso fogão da minha avó. Só
faltava aprender a cozinhar ali e assim honrar-lhe a memória, entre tachos e tachinhos.

Charneca em Flor escreve aqui. 

 

Tema 2 - Maria Araújo

27
Mai21

Era uma mulher viúva, tinha um filho ainda pequeno quando conheceu o que viria a ser o seu
companheiro durante cerca de treze anos.
Construía, na altura, um casarão, nos arredores da cidade. Dois andares, uma enorme garagem. Um
jardim à volta dele que, além de flores, cultivava legumes.
Ele era empresário, viúvo, tinha os filhos crescidos, deixou a sua casa e foi viver com ela.
E muito investiu naquele casarão.
Mostrava-o aos amigos que iam visitá-la, sobretudo nas festas de aniversário do seu filho.
Um dia , numa festa, a acontecer na garagem, que as filhas dele também foram convidadas, e porque
não conheciam a casa, sem que a anfitriã percebesse, foram espreitar os andares de cima.
Tudo muito "bem" mobilado, aquele estilo dom não sei das quantas, os pés da mesa da sala de jantar
eram rsotos de leão.
O sótão estava carregado de brinquedos, por abrir, que eram oferecidos, no Natal e aniversário, ao filho,
mas que ela não deixava que brincasse com eles.
Passaram pela cozinha.
Acharam estranho que o movimento na garagem fosse grande e esta cozinha estivesse intocável. E o
fogão não tinha sinais de que alguma vez tivesse sido usado.
Desceram sorrateiramente até à garagem.
Uma grande mesa, encostada à parede, cheia de comida para os convidados, perguntavam-se de onde
viria tudo aquilo.
Não conheciam ninguém. O pai fazia as honras da casa, ou seja, da garagem.
Aproximaram-se de uma porta aberta. E espreitaram.
A azáfama de algumas mulheres era grande.
Afinal havia outro... fogão, numa grande cozinha na garagem.
Nesse ano,a pedido do pai, passaram lá o Natal.
Toda a festa foi passada nesta cozinha.
Dois anos depois, elas disseram ao pai que só passariam o Natal se fosse feito na sala de jantar.
Mas nunca mais voltaram àquela casa.

Maria Araújo escreve aqui. 

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